segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Mação (Portugal)

O Vale do Tejo é o maior e mais longo vale na parte ocidental da Península Ibérica. Em Mação, a arte rupestre é um dos itens patrimoniais de entre uma série de evidências relevantes de todos os períodos durante os últimos 300.000 anos mas, principalmente, sobre as origens da agricultura.
Hoje, Mação é uma região que enfrenta o despovoamento e a desertificação. Contudo, foi concebida uma estratégia que utiliza estes problemas, juntamente com o património cultural (incluindo nele as actividades agrícolas), como um meio para superar tais problemas. Um museu e centro de investigação tem sido capaz de atrair um número crescente de visitantes, gerando um crescimento de investimentos económicos (nomeadamente no sector do turismo, mas também na comercialização de produtos florestais e industriais).
O tema central do Museu local é a transformação da paisagem através da agricultura, sendo esta a matriz cultural das identidades actuais. O Museu, juntamente com o IPT e a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, acolhe programas de Mestrado e Doutoramento. O Mestrado é parte do único programa Erasmus Mundus em Arqueologia (Quaternário e Pré-História), e a lógica de construção de redes agrupadas em torno de Mação provou estar a funcionar bem: Mação é agora o segundo maior centro arqueológico em Portugal (depois de Lisboa), em termos de número de estudiosos e estudantes, e tem mais visitantes do que o Parque de Arte Rupestre de Foz Côa (Património Mundial).
Embora seu património mais relevante seja a arte rupestre e as origens da agricultura, tem também importantes relíquias de outros períodos (banhos romanos, castelos medievais, igrejas barrocas, ...) e a gestão desta difusão cultural usa esta diversidade para demonstrar como se alterou a cultura ao longo do tempo.
A estratégia do Museu foi associar uma investigação de alto nível com uma profunda articulação com a população, atraindo turismo qualificado (cultural e científico). Um exemplo disto é o projecto Andakatu, de ensino das artes através do património. Neste projecto, são organizadas oficinas com visitantes de todas as idades (a partir da escola primária), para aprender antigas técnicas de produção (pedra, cerâmica, arte rupestre e outras) num processo de ‘aprender fazendo’. No entanto, paralelamente a este projecto didáctico, o Museu com o IPT tem um projecto de investigação financiado pela Fundação Portuguesa para a Ciência e Tecnologia, precisamente sobre estas questões tecnológicas. A didáctica é capaz, portanto, de ser muito dinâmica, porque incorpora as novidades ao ritmo da investigação. Isto foi reconhecido, entre outros, por um canal privado de televisão (Canal Panda), onde o Andakatu foi seleccionado para apresentar à população mais jovem o que significa ser um arqueólogo.
Esta ligação permanente entre o património cultural e as artes também é o tema do projecto plurianual "Tranformations" financiado pelo Programa "Cultura". O projecto de Mação foi seleccionado pelo programa da UNESCO sobre a desertificação, como um dos quatro estudos de casos Portugueses e ganhou (devido aos programas intensivos realizados todos os anos sobre a qualidade da gestão do património) o prémio Ouro da Comissão Europeia em 2008 para "Casos de Sucesso" do programa Erasmus.

Espaços de Memória e Cultura em Mação

Mação
Cardigos
Aboboreira
•Casas da Ribeira
Chaveira
Penhascoso
Ortiga
 
 
A vida quotidiana exprime-se pelo conjunto de vivências, de emoções, comportamentos individuais e colectivos envolvendo o homem nas suas mais diversas actividades que se destinam a garantir o seu desenvolvimento e evolução, enquanto ser biológico e social, e as referências ao passado são uma presença constante na vida quotidiana dos indivíduos e dos grupos. Esse passado é muitas vezes transportado sob a forma de memórias ou tradições.

Os Espaços de Memória definem-se como uma combinação de arquivo histórico e centro de cidadania e convivência, preenchendo os tempos livres e ociosos, reunindo vestígios ligados ao património cultural material e imaterial. Lugares onde se possa navegar na história, revivendo as origens através de testemunhos, objectos, instrumentos de trabalho, produção artístico-cultural, documentos, apresentados didáctica e tradicionalmente, fundadores ou formadores de identidade local, de cada grupo ou pessoas, cujas actividades foram de extrema importância para a construção identitária destas comunidades.

Os Espaços de Memória e Cultura têm como fundamentos principais a protecção e valorização de histórias e objectos, troca de experiências e resgate de memórias materiais e imateriais da população. Isto é, um espelho das maneiras de ser e de estar das suas gentes, analisadas através dos objectos, criando assim uma conexão entre a cultura material recente (ainda presente no dia-a-dia das pessoas) e as colecções do Museu de Arte Pré-Histórica de Mação Mação.

Espaço de Memória e Cultura de Mação




Localizado no Instituto Terra e Memória (antiga Escola Primária de Mação), o Espaço de Memória e Cultura de Mação, alberga neste momento uma exposição de Cerâmica Guarani elaborada no âmbito do “Seminário Cadeias Operatórias na Cerâmica Arqueológica – Um encontro entre culturas; um encontro entre várias disciplinas” onde se evidencia o passado dos índios Guaranis visto através da cerâmica arqueológica. O objectivo deste Espaço é manter a ultidisciplinaridade das exposições.
Localização: Instituto Terra e Memória
Contactos: 241 571 307/241 571 477
Horário: 9h00-12h30/ 14h00 – 17h30
Pode visitar o Espaço de Memória de Mação fora deste horário, fazendo uma marcação prévia de 24h.

Espaço de Memória e Cultura de Aboboreira




Localizado na freguesia da Aboboreira, este Espaço de Memória tem como principal objectivo a protecção e valorização de objectos relacionados com as actividades tradicionais da população da freguesia da Aboboreira, bem como instrumentos ligados às suas memórias e vivências.
 
A exposição patente demonstra o carácter tradicional de uma actividade que agora se apresenta num novo contexto. A produção do linho, terá sido outrora, uma importante fonte de riqueza para algumas famílias, encontrando-se nas casas mais antigas grande parte dos utensílios usados na fabricação de tal produto.

Localização: Aboboreira, edifício da Junta de Freguesia.
Contactos: Junta de Freguesia da Aboboreira
Tel.: 241 598 005 /Tel.: 926 76 99 37
E-mail: junta.aboboreira@clix.pt
Marcação prévia de 24h.

Espaço de Memória e Cultura de Casas da Ribeira

O Espaço de Memória e Cultura das Casas da Ribeira é um pequeno Museu que foi sendo construído pela população da aldeia, tendo sido inaugurado em Junho de 2006. Reunindo um diversificado acervo na área da Etnografia, tem como objectivo contribuir para a identidade e cultura tradicional da população.




Com um espólio relacionado com as diversas culturas tradicionais, desde a Apicultura, passando pela Agricultura, o linho, as porcelanas e ainda o vestuário, relatando as memórias de cada um através dos objectos expostos.

Localização: Edifício da Associação Recreativa e Cultural das Casas da Ribeira
Contactos: Associação Recreativa e Cultural das Casas da Ribeira
Marcação prévia de 24h.

Espaço de Memória e Cultura de Cardigos



A proposta de construção de um Espaço de Memória e Cultura em Cardigos tem como objectivo principal preservar as memórias, tradições, os valores mais profundos da identidade e raízes comportamentais e culturais da população de Cardigos.




Este espaço tem como finalidade a preservação e a manutenção da identidade cultural e das memórias locais através da exposição pública de objectos fazendo referência à vida dos mais velhos, proporcionando uma experiência de interacção mais autêntica entre as pessoas do local, os mais novos e os futuros visitantes.


Localização: Edifício da Junta de Freguesia de Cardigos
Contactos: Junta de Freguesia de Cardigos 274 866 377
Marcação prévia de 24h.

Espaço de Memória e Cultura da Chaveira



Localizado na antiga Escola Primária da aldeia da Chaveira, este local foi reabilitado com a finalidade de criar uma pequena exposição alusiva à época escolar, criando uma pequena biblioteca para adultos e crianças, e organizando exposições de artesanato.
Criado com o apoio da Câmara Municipal de Mação, como Centro Recreativo e Cultural da Chaveira e Chaveirinha, esta antiga Escola Primária ganhou uma nova vida com a visita semanal de várias pessoas, de todas as idades, que se reúnem para aprender as artes dos bordados e da pintura encontrando-se entre estas a renda, os bordados, o macramé e a pintura, gerando um convívio e aprendizagem mútuos.
Localização: Antiga Escola Primária da Chaveira
Contactos: Centro Recreativo e Cultural da Chaveira e Chaveirinha
Marcação prévia de 24h

Espaço de Memória e Cultura de Ortiga



O Espaço de Memória e Cultura de Ortiga é um espaço em construção com a colaboração directa da Associação dos Amigos da Estação da Ortiga com o intuito de criar um núcleo Museográfico das Artes Tradicionais da Pesca.


Localização: Estação da Ortiga
Contactos: Associação dos Amigos da Estação da Ortiga – 93 643 86 91
Marcação prévia de 24h

Espaços de Memória e Cultura a construir:

•Espaço de Memória do Penhascoso;•Espaço de Memória de Envendos;
•Espaço de Memória de Amêndoa;
•Espaço de Memória do Carvoeiro.

domingo, 16 de dezembro de 2012

MUSEU DE ARTE PRÉ-HISTÓRICA DE MAÇÃO E “REDE PACAD”: UM PROJECTO DE INTERVENÇÃO SOCIAL

Luiz Oosterbeek1


Transformar o mundo, disse Marx, mudar a vida, disse Rimbaud:

para nós, estas duas palavras de ordem são apenas uma

André Breton




Ensinas-me a fazer tantas perguntas


Na volta das respostas que eu trazia

Quantas promessas eu faria

Se as cumprisse todas juntas

José Mário Branco

Resumo


A lógica do projecto do Museu de Arte Pré-Histórica de Mação foi, desde o início, paralela ás preocupações dominantes na esfera do património: o eixo não foi nem a conservação das colecções e sítios, nem a investigação, e sim a criação de uma dinâmica de construção de conhecimento difusa, catalisada pelo património arqueológico. Neste quadro, as necessidades de conservação e de investigação surgiram como instrumentos para uma apropriação social de qualidade do património arqueológico, que em última análise era, e é, considerada por sua vez como um instrumento de cidadania.

São apresentadas as principais soluções didácticas desenvolvidas pelo Museu, com especial atenção sobre o programa de animação científica e artística digital (PACAD).



Palavras-chave
Arqueologia – Arte Rupestre – Museologia – Conhecimento – Digital
Abstract

The Museum of Prehistoric Art of Mação, from its beginning, has had a logic parallel to the dominant concerns in the heritage sphere: its core hasn’t been the conservation of collections and sites, nor research, but the creation of a diffuse knowledge building dynamics, clustered around the archaeological heritage. In this context, the conservation and research needs are tools for a quality archaeological heritage social awareness which, in the end, was and is considered as a tool for citizenship, in its turn.

The main didactic solutions develop by the Museum are presented, with a special focus on the digital scientific and artistic animation programme (PACAD).

Key-words
Archaeology – Rock Art – Museology – Knowledge – Digital

ACASO, CRÍTICA E UTOPIA
Em 6 de Setembro de 2000, a escassos dias do congresso da Associação Europeia de Arqueólogos, era descoberta uma gravura paleolítica no vale do Ocreza, em Mação, no âmbito de uma colaboração entre o CEIPHAR e o ex-CNART2 . Ao pedido de colaboração, que então foi feito pela equipa do CEIPHAR à Câmara Municipal de Mação, no sentido de preservar os vestígios rupestres, respondeu aquela com uma proposta de colaboração do Centro na reorganização do Museu de Mação.
O projecto do Instituto Politécnico de Tomar (IPT), desde o início da década de 1990, fora o de conseguir articular quatro dimensões que estão, no ordenamento jurídico-institucional, separadas, com grave prejuízo para o património e para os cidadãos3: a investigação (essencial para a identificação e compreensão do património), a educação (essencial para a formação de técnicos especializados mas, também, para a formação global de uma consciência patrimonial na sociedade), a preservação (crucial para que os bens identificados se conservem no tempo) e o usufruto do conjunto dos cidadãos (razão de ser de todos os anteriores)4 .
No nosso País, como aliás em muitos outros, estas vertentes, que deviam estar permanentemente articuladas, encontram-se institucionalmente espartilhadas. A investigação é do foro da Fundação para a Ciência e Tecnologia, com alguns complementos do Ministério da Cultura, de privados ou de autarquias, apesar de ser protagonizada essencialmente pela rede de ensino superior (que não tem meios financeiros para tal). A educação é da competência do Ensino Superior, que não tem um acesso fluído ao património arqueológico e convive com escassos recursos financeiros, o que muitas vezes prejudica a qualidade da formação que pode oferecer5 . A preservação é da competência do Ministério da Cultura, que depois de algumas aventuras mal sucedidas no campo do Ensino, e por não ser capaz de com ele se articular (bem pelo contrário), se revela incapaz de delinear uma estratégia global para o património, que só seria possível numa lógica de rede de recursos, e se vai limitando, apesar das boas intenções dos protagonistas, a gerir “imóveis afectos” e a “fiscalizar” o “resto” (com escassos recursos humanos, nem sempre suficientemente preparados ou equipados), com breves e inconsequentes incursões nas vertentes da formação, da investigação e da valorização. O usufruto, promovido pelo Ministério e de forma crescente por autarquias e mesmo por privados, apesar das dificuldades do movimento associativo que em tempos foi estruturante6, vai chegando aos cidadãos de forma desarticulada (entre si) e desconectada da esfera em que devia ser estruturante (precisamente a do ensino)7.
O projecto da equipa do IPT foi o de construir um plano integrado8, e essa sugestão foi inicialmente proposta ao Município de Tomar (início da década de 1990, sem que a autarquia se interessasse pela ideia) e depois a Abrantes (1992-1993, tendo um projecto sido aprovado, e logo abandonado, pela respectiva Câmara Municipal). A criação do Centro de Interpretação de Arqueologia do Alto Ribatejo, em Vila Nova da Barquinha (no final da década e com forte envolvimento da autarquia e da Secretaria de Estado da Juventude, ao tempo liderada por Miguel Fontes) foi a primeira concretização deste plano. Mas seria só em Mação, em 2001, que o projecto se começou a estruturar globalmente, como um instrumento de gestão territorial9 (num processo em que foi decisiva a intervenção do então vereador da Cultura e hoje Presidente da Câmara, Saldanha Rocha)10.
O MUSEU COMO INSTRUMENTO
A lógica do projecto do Museu de Mação foi, desde o início, paralela ás preocupações dominantes na esfera do património: o eixo não foi nem a conservação das colecções e sítios, nem a investigação, e sim a criação de uma dinâmica de construção de conhecimento difusa, catalisada pelo património arqueológico. Neste quadro, as necessidades de conservação e de investigação surgiram como instrumentos para uma apropriação social de qualidade do património arqueológico, que em última análise era, e é, considerada por sua vez como um instrumento de cidadania.
Assumida esta orientação, a questão seguinte foi a de definir qual o melhor plano museológico para servir esse objectivo social e cultural mais vasto. O projecto foi sendo estruturado entre 2002 e 2005 (ano da reabertura do Museu), apoiando-se em particular na avaliação dos interesses e expectativas da população local (através de inquéritos e entrevistas), bem como nas potencialidades e perspectivas gerais do município (através de reuniões e discussões sucessivas, por forma a assegurar a plena convergência estratégica).
A primeira opção foi inverter a lógica de exposição do conjunto das colecções, substituindo a exposição de peças pela organização de temas expositivos para debate (apoiados nas peças), e construindo uma exposição sobre uma temática relativamente “obscura” para o grande público (o Paleolítico inferior e médio no Sul da Europa) aliada a uma materialidade extremamente aliciante e amigável (paleo-solos que se podiam tocar, textos curtos, visitas guiadas). O essencial foi combinar uma contenção radical de custos com uma qualidade cénica distintiva11. Esta opção permitiu “inundar” o Museu de habitantes de Mação, mas também trazer muitos outros visitantes.

A segunda opção foi a de construir uma imagem diferenciada, que permitisse projectar o Museu não apenas fora de Mação mas dentro da comunidade, não apenas como museu municipal (que continua a ser, não por ser um repositório de peças locais mas por o seu programa ser discutido com a população local), mas como congregador de especificidades locais de interesse supra-municipal (como é o caso das produções locais de presunto ou de mel), articuladas com as respectivas identidades12. Assim se concebeu a nova designação do Museu de Arte Pré-Histórica e do Sagrado do Vale do Tejo. O Museu assumiu assim uma vocação regional e temática, sem perder a vocação local.
O passo seguinte foi a reestruturação global do Museu, assumindo um novo eixo temático para a “casa-mãe” (a arte rupestre associada aos primórdios da agricultura) e projectando extensões museográficas em diversos pontos do concelho13. A nova exposição permanente, reduzindo-se na amplitude temática e artefactual (Neolítico e Calcolítico) possibilitou um discurso sobre a relação entre o comportamento humano e o seu contexto ambiental e climático, que consente uma conexão directa com as preocupações da sociedade actual e o ocaso do “mundo rural” que ainda é o alicerce de muitas identidades. Sobre este eixo, que valoriza essencialmente a didáctica da importância da tecnologia e da racionalidade na sociedade, foram organizados os serviços educativos e todos os projectos didácticos, com particular destaque para o projecto Andakatu14.

Finalmente, uma vez definido o eixo programático e a estratégia museográfica, consolidou-se o projecto em quatro vertentes. Em primeiro lugar a investigação, afirmando uma centralidade academia através do acordo estabelecido com o Instituto Politécnico de Tomar para criar junto do Museu uma unidade de investigação, que veio a acolher o Mestrado em Arqueologia Pré-Histórica e Arte Rupestre e o Doutoramento em Quaternário, ministrados pelo IPT e pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. Para a sua consolidação o Museu deu especial atenção à estruturação de uma biblioteca temática, hoje com mais de 40.000 registos e em rápido crescimento15 e pela organização de laboratórios de tecnologia lítica16, arte rupestre17, geo-arqueologia e paleobotânica (em fase de montagem). Esta unidade de investigação e formação é hoje a base logística do grupo de Quaternário e Pré-História do Centro de Geociências (FCT), reunindo mais de 160 investigadores com projectos coordenados a partir de Mação, não apenas na região e no País, mas também em Espanha, Itália, Grécia, África e América do Sul18. A vertente de investigação assume-se como a coluna vertebral de todo o projecto.
A segunda vertente estruturante é a gestão e conservação de colecções, sítios e outros recursos19, normalizando procedimentos num modelo que se apoia na colaboração de estudantes, que fazem parte da sua formação no quadro das acções do Museu. Neste domínio, o Museu tem-se dedicado em particular à pesquisa sobre métodos de prevenção e de minimização do impacte de incêndios. Para além desta componente, estruturou um percurso de 14km de caminhos com visitação de sítios de arte rupestre e outros locais arqueológicos, que funciona como área de conservação privilegiada.

A terceira vertente é a das visitas guiadas. Toda a lógica da acessibilidade ao Museu é a de proporcionar conversas, entre os visitantes e destes com monitores do Museu (os investigadores e estudantes do Museu e do Mestrado), visando suscitar reflexões sobre o tema central do Museu e as diversas exposições. A museografia é essencial para a construção de uma relação conceptual entre os investigadores e os demais utilizadores do museu, e carece de recurso quer a novas tecnologias20 quer a estratégias inclusivas21. E é neste campo que o Museu e o IPT mais reflectiram e mais experiências têm promovido, designadamente as actuais exposições táctil e digital.

INTERROGAÇÕES E INQUIETAÇÕES
A reflexão que em dado momento formos fazendo foi a seguinte: construímos discursos que depois disseminamos em estruturas crescentemente caras, que no final acabam por se destinar a nós mesmos, e aos que como nós realizaram os seus estudos, frequentaram a universidades, e talvez estejam por seu lado a construir outros discursos, nas suas especialidades, para nós. De fora fica o grosso da população, condenada a vulgatas sem qualidade, a um divórcio crescente com a produção do saber. Os resultados são por um lado uma alienação crescente e por outro o avanço da incultura e dos equívocos como a deriva do Museu dos Coches ou das incertezas sobre o futuro de museus nacionais, como o Museu Nacional de Arqueologia22.

É tempo de sairmos de uma torre de marfim em que, há demasiado tempo, nos deixámos enclausurar. É tempo de perguntar em que medida os modelos de intervenção profissional na esfera do património arqueológico (ensino, pesquisa e musealização) correspondem ao que a sociedade necessita.

A questão colocou-se então da seguinte forma: é possível construir um instrumento museográfico que associe qualidade e acessibilidade potencialmente universal, colocando os investigadores em relação directa com os cidadãos que estão “fora do sistema cultural”? Ou, dito de outra forma, é possível criar um instrumento que integre os cidadãos no processo de construção de conhecimento sobre o passado, e não os trate apenas como consumidores de saberes-pronto-a-vestir?23

Desde a sua re-abertura, em 2005, o Museu construiu um eixo de debate sobre a questão rural, a partir da pré-história, com extensões para diversas dimensões do comportamento humano e das suas condicionantes (tecnologia, ideologia, arte, clima, geologia, ambiente). A exposição permanente, numa sala pequena, com apenas 137 peças expostas, é percorrida durante, em média, meia-hora, mas as visitas chegam a demorar duas horas. A experiência de recorrer a poucos textos, poucas peças, e muita conversa, ao cabo de 40.000 utilizadores, permitiu-nos concluir que o visitante médio sai do Museu tendo conquistado certas noções (habitat, tecnologia, neolítico, megalitismo, arte rupestre, entre outras), mas que a sua competência crítica nem sempre é efectivamente reforçada. Com efeito, apesar de o método didáctico se apoiar no diálogo e na interrogação, a tendência do utilizador, sobretudo quando confrontado com a presença de tantos investigadores em torno do Museu, é a de respeitar e acolher a interpretação académica, inibindo a sua própria capacidade crítica. O objectivo de um Museu, no entanto, passa não apenas pela sedução mas também pela resistência que oferece a uma apreensão meramente consumista, sendo que um museu de arqueologia se apoia em especial na conceptualização da cultura material24.
É no quadro destas inquietações que foram organizadas a exposição táctil e o projecto PACAD.

O visitante que hoje chega ao Museu encontra três exposições, que no essencial “falam do mesmo”: um percurso digital, de manipulação de imagens vinculadas a conceitos, e que é aleatório; um percurso táctil, estruturado em função do tacto (a exposição é especialmente adequada a invisuais, mas como a visita é feita sem luz oferece a todos os demais uma experiência de percepção do mundo sem recurso à visão); um percurso visual “clássico”, com as peças originais em vitrinas. A unidade e convergência conceptuais das exposições são sublinhadas pelo título geral: Um Risco na Paisagem – Uma Paisagem em Risco. As origens do mundo rural são identificadas como riscos/alterações na paisagem (artefactos novos, estruturas sepulcrais, arte rupestre), que por sua vez se encontra em risco (ameaçada de destruição e comportando situações e condicionalismos de risco, como a cegueira).
Os utilizadores do Museu vão-se assim apercebendo de como as próprias noções que estruturam se modificam em função dos percursos (aleatório ou orientado), dos suportes (digital, réplicas ou originais) e dos sentidos utilizados. Não é preocupação do Museu que o visitante necessariamente conceptualize esta polifonia, mas apenas a de que a vivencie, ampliando a consciência sobre essas categorias (decisão/orientação, verdadeiro/falso, ver/tocar, sentir/imaginar), sempre estruturadas em torno de alguns conceitos chave: agricultura, recolecção, caça, arte rupestre, ambiente, cultura, espaços de habitat, espaços funerários, …

O utilizador do Museu percorre primeiro, no piso inferior, as exposições digital (aleatória) e táctil (orientada). Só quando acede ao segundo piso é que se confronta com a reflexão estruturante do Museu, que se exprime num curto texto (que se constitui, no entanto, como o texto mais longo de todos os que enquadram as exposições):

ENTRE O QUE NUNCA FOI E O QUE JAMAIS SERÁ.


O Museu de Arte Pré-Histórica e do Sagrado do Vale do Tejo convida a pensar a relação entre o sagrado e o profano, em diferentes momentos da história da região.

Cada objecto aqui apresentado é um ponto de interrogação sobre o passado que já foi e sobre o presente em que construímos as nossas paisagens. É um convite à inquietação, à insatisfação,… e à curiosidade por tudo o que é diferente.

Porque é nessa dimensão que vivemos, entre um passado que nunca foi exactamente como pensamos, e um futuro que jamais caberá nos limites da nossa imaginação.
MATERIALMENTE VIRTUAL – A REDE PACAD

O projecto de animação científica e artística digital (PACAD)25 é uma exposição de conteúdos virtuais que são manipulados pelos utilizadores. A exposição é feita sobre uma tela, onde se projectam imagens organizadas em unidades geográficas (por exemplo Senegal ou Vale do Ocreza) ou temáticas (por exemplo Museu de Museus ou Indústria Lítica), integradas em quatro pares de conceitos gerais: caçadores-recolectores, agricultores e metalurgistas, arqueologia e paisagem, arte rupestre e arte contemporânea. Cada unidade de conteúdos digitais é formada por um grupo limitado de imagens ou por um pequeno filme, sendo que as escolhas de temas ou locais são decididas pelo utilizador do Museu, que encontra em cada uma dessas unidades um conjunto não estruturado de conteúdos.
Embora similar na forma a alguns jogos de consola, o sistema PACAD é muito distinto, pois além de se apoiar num software novo, decorre de um conceito radicalmente diferente: os conteúdos são escolhidos por apenas um ou dois utilizadores (como se estivessem em casa, com um computador pessoal), mas no espaço do Museu (definindo assim o conteúdo da visita que os demais utilizadores do Museu pode fazer). O utilizador/manipulador do sistema converte-se, assim, numa espécie de comissário de exposição, “impondo” as suas escolhas aos demais visitantes, o que nos permite debater a natureza das exposições num museu e o grau de autonomia dos seus utilizadores.

Assim, o sistema PACAD é um meio de acesso progressivo a conteúdos de arqueologia e arte rupestre, nas suas dimensões artística e científica. Todas as imagens, sem excepção, resultam das investigações dos pesquisadores do Grupo de Quaternário e Pré-História do Centro de Geociências26, informação que é transmitida aos visitantes. Por este meio, cada utilizador pode percorrer os sítios estudados pelos arqueólogos e compreender melhor os mecanismos de construção do conhecimento sobre o passado, que em parte é chamado a utilizar. Nesta exposição, o utilizador decide o que vê, mas cada imagem tem um autor que teve uma intenção ao registá-la, e com o qual o utilizador poderá, mais tarde, contactar.

O sistema PACAD estruturou-se, também, como um “Museu em Rede”. Na verdade, o sistema criado no Museu de Arte Pré-Histórica de Mação foi igualmente instalado na Fundação Museu do Homem Americano, no Piauí (Brasil), onde se apresentam conteúdos essencialmente vinculados à investigação da Serra da Capivara (Património Mundial, declarado em função do complexo rupestre e dos vestígios da mais antiga presença humana nas Américas). Nos próximos meses, outros espaços idênticos serão instalados em diversos museus em Portugal, no Brasil, e em outros países Europeus. Em cada um dos museus, para além dos conteúdos próprios de cada um, é possível aceder a uma selecção de conteúdos do Museu de Arte Pré-Histórica de Mação e, também, “entrar” nos demais museus da rede (utilizando a internet). Com estas funções, pretende-se por um lado construir com os visitantes um conjunto de noções sobre a unidade do comportamento humano, expressa na sua extraordinária diversidade de soluções culturais, ao mesmo tempo que se coloca os visitantes em contacto directo com investigadores e, também, com outros utilizadores (por exemplo, será em breve possível a um visitante em Mação falar com outro que, no mesmo instante, esteja a visitar outro dos Museus em rede, conversando sobre as respectivas realidades e colecções).

O sistema articula-se, finalmente, com o portal de canais de televisão www.arqueomacao.tv, aqui se estabelecendo uma relação directa entre a produção de conhecimento e a sua difusão. Este canal de televisão por internet é outro instrumento de aproximação dos utilizadores do Museu a diferentes dimensões da investigação, servindo o objectivo geral de construir conceitos e de percepcionar o conhecimento como resultado de um processo analítico e interpretativo, e não como uma mera revelação.

O conjunto das soluções tecnológicas envolvidas (software e hardware) não é disponibilizado para comercialização: uma vez patenteadas, elas são actualmente geridas no seio das redes de investigação e intercâmbio académico em que o Museu, com o Instituto Politécnico de Tomar, participa.

A expansão progressiva deste sistema, que deverá integrar museus de Itália e do leste Europeu em 2010 e 2011, ajudará seguramente a aferir o seu impacto, a melhorar as suas soluções tecnológicas e conceptuais e a minimizar os erros que se forem identificando.
_________

1 Professor Coordenador do Instituto Politécnico de Tomar. Director do Museu de Arte Pré-Histórica de Mação. Responsável do Grupo de Quaternário e Pré-História do Centro de Geociências (FCT).

2 BAPTISTA, A. M. (2001), Ocreza (Envendos, Mação, Portugal central): um novo sítio com arte paleolítica de ar livre. IN: A.R.Cruz, L.Oosterbeek, coord. (1999), Territórios, Mobilidade e Povoamento no Alto Ribatejo III – Santa Cita e o Quaternário da Região, série ARKEOS, vol.11, Centro Europeu de Investigação da Pré-História do Alto Ribatejo, pp.163-192.

3 CRUZ, A.R., L. OOSTERBEEK (1999), La “Rede Museográfica do Alto Ribatejo”: Tomar, Barquinha e Ferreira do Zêzere (Portugal), IN: Carlo Peretto (ed.), Landscape Changes in Relation to the Human-Environment Relationship in Southern Europe during the Pleistocene, Forlí, ABACO-MAC Srl, pp. 75-86.

4 OOSTERBEEK, L. (1996). Teaching and Training Archaeology at Tomar. IN: Archaeology, Methodology and the Organisation of Research (research and excavations of the universities and institutes participating in the Erasmus Project ICP-P-1041) – Proceedings of the Round Table, Isernia, 27 May 1994, Forlí, ABACO Ed.,61-72.
5 OOSTERBEEK, L. (1999), Artes, Ciências e Tecnologia: dialéctica da educação ou o paradoxo da modernidade politécnica, IN: A.R.Cruz, L.Oosterbeek, coord. (1999), 1º Curso Intensivo de Arte Pré-Histórica Europeia, série ARKEOS, vol.6, tomo I, Centro Europeu de Investigação da Pré-História do Alto Ribatejo, pp.179-186.
6 OOSTERBEEK, L. (1997) Associativismo e Património. IN: Cruz, A.R., L.Oosterbeek, coord. (1997), 1º Colóquio de Gestão do Património Arqueológico – perspectivas em diálogo, Tomar, série ARKEOS, vol.1, Centro Europeu de Investigação da Pré-História do Alto Ribatejo.
7 JORGE, V.O., OOSTERBEEK, L. (1997). Elementos para a História Recente da Arqueologia Portuguesa: a actividade da Comissão Instaladora do Instituto Português de Arqueologia (Dez. de 1995-Set. de 1996). IN: Trabalhos de Antropologia e Etnologia, vol.XXXVII, 85-103.
8 OOSTERBEEK, L. (2007), Ordenamento cultural de um território. IN: José Portugal, S. Marques (eds.), Gestão cultural do território. Porto : Setepés, 2007.
9 OOSTERBEEK, L. (2008), Gestão Integrada do território e do património cultural, IN: Área Domeniu, vol. 3, pp. 11-17.
10 OOSTERBEEK, L. (2002), Museu Municipal de Mação: Museu de Arte Pré-Histórica e do Sagrado do Vale do Tejo. IN: A.R.Cruz, L.Oosterbeek, coord. (1999), Territórios, Mobilidade e Povoamento no Alto Ribatejo III – Arte Pré-Histórica e o seu contexto, série ARKEOS, vol.12, Centro Europeu de Investigação da Pré-História do Alto Ribatejo, pp.11-28.
11 Apoiada em equipamentos e layout museográfico construídos por Mariano Piçarra sobre o programa definido por L.O.
12 OOSTERBEEK, L. (2005), Arqueologia e Identidades: a torre de marfim na encruzilhada, IN: Cadernos do LEPAARQ, Instituto de Ciências Humanas da Universidade Federal de Pelotas, vol.II, nº 3, pp. 37-46.
13 Sítios e espaços de memória, estes últimos integrados num projecto de rede coordenada por Margarida Morais. Vd. OOSTERBEEK, L., Margarida MORAIS, André LOPES (2008), Espaços de Memória e Cultura em Mação. Breve exposição. IN: Zahara, nº 11, Abrantes, Centro de Estudos de História Local – Palha de Abrantes, pp. 60-64.
14 Assumido principalmente por Pedro Cura. Vd. OOSTERBEEK, L., Sara CURA, Pedro CURA (2007), Educação, criatividade e cidadania no Museu de Arte Pré-Histórica de Mação, IN: Revista de Arqueologia, Sociedade de Arqueologia Brasileira, vol. 19, pp. 103-110.
15 Cuja organização é orientada por Fernanda Torquato, com apoio de Isabel Afonso. Vd. TORQUATO, F. (2007), Caracterização geral da biblioteca de Arqueologia e História do Alto Ribatejo. IN: Oosterbeek, L., Bastos, R.L., Arqueologia Trans-Atlântica, Erechim, RS, Editora Habilis, pp.217-258.
16 Orientado por Sara Cura.
17 Orientado por Mila Simões Abreu, com a colaboração de Guillermo Muñoz.
19 Actualmente coordenada por Anabela Pereira, com a colaboração de Teixeira Marques.

20 QUAGLIUOLO, M. (2000), La gestione del patrimonio culturale : atti del IV Colloquio Internazionale : proceedings of the 4th International Meeting : nuove tecnologie e Beni Culturali e Ambientali : Torino : 4-8 dicembre 1999. Montepulciano [Sicilia] : Balze, 255 [1] p.

21 GONZÁLEZ MÉNDEZ, Matilde (2000), Memoria, historia y patrimonio : hacia una concepción social del patrimonio : toward a social concept of the heritage. Madrid : Departamento de Prehistoria. Instituto de Historia. Consejo Superior de Investigaciones Cientificas.
22 OOSTERBEEK, L. (2008), Património Cultural: mais um pouco do mesmo. In: Obscena. Revista de Artes Performativas, nº 16/17, Nov/Dez 2008, pp. 24-25.

23 OOSTERBEEK, L. (2008), A arqueologia de um ponto de vista social: recursos, identidades e riscos num contexto de mudança. In: S. Figueiredo (ed.), Actas das Jornadas de Arqueologia do Vale do Tejo, em território português, Lisboa, Ed. Cosmos.

24 RAPOSO, Luís (1997). Arqueologia em diálogo: o papel dos museus. IN: I Colóquio de Gestão do Património Arqueológico. Tomar: CEIPHAR, Centro Europeu de Investigação da Pré-História do Alto Ribatejo, pp. 73-90.

25 Desenvolvido e patenteado por uma parceria entre o Centro de Interpretação de Arqueologia do Alto Ribatejo (CEIPHAR) e a empresa Benefits and Profits (B&P), com especial intervenção de Vítor Teixeira.

26 Incluindo os alunos do Mestrado em Arqueologia Pré-Histórica e Arte Rupestre e do Doutoramento em Quaternário, Materiais e Culturas (ministrados pelo Instituto Politécnico de Tomar e pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro).

PROJETO PARANAPANEMA

O CENTRO DE ARQUEOLOGIA AMBIENTAL é um órgão do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo localizado em Piraju, Estado de São Paulo. Idealizado pela arqueóloga Luciana Pallestrini, suas raízes remontam os anos 1960, quando a equipe de arqueologia do Museu Paulista da Universidade de São Paulo iniciou suas atividades no trecho médiosuperior da bacia do rio Paranapanema. Naquela ocasião foram abertas algumas frentes de escavação arqueológica nos municípios de Itapeva, Piraju e Campina do Monte Alegre (então distrito do Município de Angatuba).

O que sinalizou e tornou realidade a implantação deste CENTRO foi a necessidade de se criar uma base operacional que apoiasse as atividades de campo e de laboratório executadas pela equipe de arqueologia na região do Paranapanema. No entanto, a melhor justificativa para tal empreendimento certamente foi o significativo potencial arqueológico da área; isto havia exigido, ainda em 1968, a organização daquele que é o mais antigo programa acadêmico de pesquisas arqueológicas do Estado de São Paulo, o PROJETO PARANAPANEMA. De fato, os vínculos entre o centro e o programa acadêmico têm sido inalienáveis e isto se explica por uma relação de permanente reciprocidade: o CENTRO REGIONAL é produto do PROJETO PARANAPANEMA e, na prática, a permanência de ambos tem sido garantida pelo mútuo envolvimento em objetivos convergentes.

SOBRE A ARQUEOLOGIA REGIONAL DO PARANAPANEMA

Em 1968, Luciana Pallestrini iniciou escavações no sítio arqueológico Fonseca, localizado no Município de Itapeva, Estado de São Paulo, sub-bacia do Paranapanema superior. Em 1969, atendendo ao chamado de outro achado fortuito, escavou o sítio Jango Luís, situado no então Distrito de Campininha, no Município de Angatuba, também na sub-bacia do Paranapanema superior. Ainda naquele ano, foi registrada nova solicitação: haviam desenterrado uma urna indígena em Piraju, já na sub-bacia média.

Tanta coincidência em termos de bacia hidrográfica motivou a invenção de um programa de pesquisas arqueológicas e a escolha do nome recaiu sobre o grande rio. Pallestrini criava, em 1969, o PROJETO PARANAPANEMA.

Já naquela época, atenta às necessidades de extroversão de suas investigações científicas, a então líder do Setor de Arqueologia do Museu Paulista realizava palestras e exposições nas escolas da cidade, lançando as bases para os novos interesses do CENTRO REGIONAL: a educação para o patrimônio arqueológico.

NASCE O CENTRO REGIONAL DA USP EM PIRAJU

Em 1972, quatro anos após o início das pesquisas do PROJETO PARANAPANEMA, entendimentos havidos entre o Museu Paulista e a Prefeitura de Piraju permitiram a criação de um centro de arqueologia. Mário Neme, então diretor do Museu Paulista, e Joaquim Otoni da Silveira Camargo, prefeito de Piraju, eram velhos conhecidos da época em que trabalharam no jornal O Estado de S.Paulo e isto facilitou sobremaneira o fechamento de um acordo de cooperação. Nascia, assim, o CENTRO REGIONAL DE PESQUISAS ARQUEOLÓGICAS DE PIRAJÚ, extensão do Museu Paulista a funcionar como base de apoio operacional da arqueologia recém-inaugurada nas bandas do Paranapanema.

Em 1967, a Estrada de Ferro Sorocabana desativara o ramal ferroviário de Piraju e, em 1972, Quinzinho Camargo solicitou ao Estado que o prédio da Estação, então abandonado, fosse cedido à Prefeitura para acolher o CENTRO REGIONAL. A idéia não vingou e, embora houvesse contratempos relacionados com freqüentes mudanças de endereço, a Prefeitura de Piraju sempre garantiu a permanência do que era informalmente conhecido como o “Museu da USP” naquela cidade. Foi muito importante o apoio inicial da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras.

O CENTRO REGIONAL E O NOVO MAE

Em 1989, com a integração dos acervos arqueológicos e etnográficos da USP no Museu de Arqueologia e Etnologia, o controle do CENTRO REGIONAL passou para o novo MAE. Em 1995, quando estava na Prefeitura de Piraju como secretário de Planejamento e Meio Ambiente, José Luiz de Morais tomou conhecimento de que a USP era proprietária de um imóvel havido por herança vacante naquela cidade. Assim vislumbrou a possibilidade de pleiteá-lo para acolher o acervo e as atividades do CENTRO REGIONAL DE PESQUISAS ARQUEOLÓGICAS MÁRIO NEME pois seria incabível que a municipalidade continuasse alojando, às suas expensas, as instalações do centro universitário da USP. Após tramitação que durou pouco mais de cinco anos, a administração superior da universidade definiu que o imóvel seria colocado à disposição do MAE, para lá se instalasse o seu CENTRO REGIONAL DE ARQUEOLOGIA.

Inaugurou-se, a partir dessa decisão, nova frente de trabalho. Entre o prazo legal para a desocupação do imóvel (que estava alugado), a disponibilidade dos Recursos necessários para as reformas e a edição de lei municipal prevendo a colaboração da municipalidade no processo, foram outros quatro anos. Os recursos necessários foram concedidos pela USP; a Prefeitura cedeu a mão-de-obra para a execução da reforma. O projeto de reforma e readaptação do imóvel é da arquiteta Daisy de Morais, da equipe do PROJETO PARANAPANAPEMA.

Em julhode 2004, o agora CENTRO REGIONAL DE ARQUEOLOGIA AMBIENTAL MARIO NEME passou a funcionar na CASA DA USP EM PIRAJU.

CONSOLIDANDO A NOVA ETAPA

Reinstalado na CASA DA USP, o CENTRO REGIONAL DE ARQUEOLOGIA AMBIENTAL inicia a mais recente etapa da sua existência pois, aos 36 anos, ainda há tarefas importantes a serem realizadas.

1 - Embora a reforma e adaptação do espaço tenha sido concluída, resta adquirir e instalar equipamentos que garantam o funcionamento de suas atividades que deverão abranger o ciclo completo da missão acadêmica: pesquisa, ensino e extensão universitária. Esta ordem tem a ver com a vocação do CENTRO REGIONAL: base de apoio operacional às pesquisas arqueológicas, apoio às disciplinas de graduação e pós-graduação, manutenção de mostra permanente da arqueologia regional de cunho didático-pedagógico, preleção de cursos de extra-curriculares com fulcro na arqueologia e áreas afins.

2 - A redistribuição do acervo arqueológico teve que enfrentar um espaço edificado mais exíguo, correspondente à antiga casa de moradia. Parte das coleções arqueológicas foi provisoriamente acondicionada em um dos antigos armazéns do complexo ferroviário tombado pelo município.

3 - Foram iniciados os estudos necessários para a concepção da mostra permanente de arqueologia regional, que deverá focalizar os cenários das ocupações humanas, da pré-história à consolidação do fenômeno urbano na bacia do Paranapanema paulista. Sem inviabilizar outros segmentos, o público-alvo é o conjunto de alunos do ensino fundamental.

4 - Como o lote de terreno é amplo (cerca de 1.200 m2), será possível construir reserva técnica para o acervo, laboratório, espaço para biblioteca e documentação, alojamento para pesquisadores e auditório. Portanto, assim que a fase de consolidação da mundança for concluída, serão encaminhados esforços no sentido de alocar os recursos necessários para a elaboração do projeto e a execução dessas obras.

UM ACERVO ESPETACULAR

O CENTRO REGIONAL DE ARQUEOLOGIA AMBIENTAL acolhe e mantém sob a sua guarda um acervo arqueológico que se destaca:

a] pela quantidade: são mais de 350 coleções correspondentes pela quantidade a cada registro arqueológico pesquisado pelo PROJETO PARANAPANEMA; o número de peças de cada uma varia entre poucas unidades (ocorrências arqueológicas pouquíssimo densas) e milhares. Nesta última categoria encontra-se a maior parte das coleções, como as do sítio Piracanjuba – Piraju (25 mil peças), do sítio Brito – Sarutaiá (25 mil peças), sítio Camargo – Piraju (10 mil peças), sítio Alvim – Pirapozinho (7 mil peças), sítio Fonseca – Itapeva (5 mil peças), dentre outros.

b] pela qualidade: todas as coleções resultam das pesquisas sistemáticas do PROJETO PARANAPENEMA; têm, portanto, alguns atributos essenciais: são georreferenciadas em várias escalas de aproximação (isto inclui a posição estratigráfica), muitas têm datação e, além disso, foram formadas segundo as diretrizes teóricas e conceituais dos projetos específicos que as geraram.

c] pela abrangência regional: o acervo cobre praticamente toda a extensão da bacia do rio Paranapanema no Estado de São, com coleções de municípios das sub-bacias superior, média e inferior.

d] pela abrangência temporal: o acervo cobre todos os cenários das ocupações humanas da bacias do Paranapanema e seus respectivos sistemas regionais de povoamento; portanto, há coleções pré-históricas de 7 mil, 5 mil ou 3 mil anos (macrossistema de caçadores-coletores indígenas), de 2 mil, mil ou 500 anos (macrossistema de agricultores indígenas), ou históricas (meados dos séculos 19 e 20).

e] pela natureza de materiais arqueológicos: praticamente todos os segmentos de coleções típicas de sítios arqueológicos indígenas do interior estão presentes nas proporções costumeiras (cerâmicas, líticos lascados, líticos polidos, ossos); ou de sítios históricos (telhas, tijolos, louças, vidros, metais). Destaca-se o elevado número de vasilhas de cerâmicas praticamente completas, como as grandes urnas.

SEGUNDA PARTE: GESTÃO ACADÊMICA

O projeto de gestão acadêmica do CENTRO REGIONAL DE ARQUEOLOGIA AMBIENTAL MÁRIO NEME é pautado nos princípios, missão, objetivos e estratégias definidos para o Museu de Arqueologia e Etnologia, consideradas as necessárias adaptações em termos de foco (convergência para a arqueologia regional), abrangência (municípios da bacia do rio Paranapanema) e perfil regional (compatibilidade com a vocação ambiental da região, centrada na valorização do meio físico-biótico e socioeconômico-cultural).

PRINCÍPIOS

a] Integração plena nas políticas institucionais do MAE e da Universidade de São Paulo.

b] Convergência temática para a arqueologia regional do Paranapanema, abrangendo as populações indígenas pré-coloniais e os ciclos regionais da sociedade nacional.

c] Priorização das salvaguardas e extroversão relacionadas com o acervo, pautadas no ciclo completo do processo curatorial, que inclui a educação para o patrimônio.

d] Gestão pela qualidade total, incluindo a adesão aos padrões de qualidade relacionados com os diferentes tópicos da administração acadêmica.

MISSÃO INSTITUCIONAL

Promover a valorização, difusão e inclusão social do patrimônio arqueológico da bacia do rio Paranapanema por meio da pesquisa, ensino e extensão universitária.

OBJETIVOS INSTITUCIONAIS

a] Produzir e difundir conhecimentos e acervos arqueológicos relacionados com os sistemas regionais de povoamento da bacia do rio Paranapanema.

b] Colaborar com o poder público municipal distribuído pelos municípios da bacia do rio Paranapanema, nos assuntos relacionados com o patrimônio arqueológico.

c] Colaborar com os órgãos de preservação patrimonial e ambiental atuantes na bacia do rio Paranapanema.

d] Promover o intercâmbio científico e cultural com outros órgãos acadêmicos e de pesquisa atuantes na bacia do rio Paranapanema.

ESTRATÉGIA

Os instrumentos operacionais que permitem ao CENTRO REGIONAL cumprir a sua missão e objetivos institucionais estão organizados de acordo com os seguintes eixos programáticos:

1º — Consolidação institucional

* Organização da estrutura orgânica, da peça orçamentária e inserção no Regimento e Organograma do MAE.

* Ampliação e reorganização do quadro de servidores técnicos.

2º — Consolidação espacial

* Concepção, planejamento e execução de obras complementares no espaço físico, reservando a edificação de época (atual) para as atividades de extroversão.

3º — Fomento à pesquisa

* Consolidação do ciclo completo do processo curatorial, do campo à extroversão:

— formação e desenvolvimento de coleções representativas da arqueologia regional, considerados os perfis dos projetos de arqueologia propostos para a bacia do rio Paranapanema;

— conservação das coleções, que inclui soluções de armazenamento e de restauração, quando for o caso;

— estudo, documentação e circulação dos conhecimentos produzidos para fins científicos e de formação profissional;

— comunicação (expografia de coleções arqueológicas).

4º — Ensino e educação para o patrimônio

* Cursos extra-curriculares; apoio à preleção de disciplinas de graduação e de pós-graduação

* Ações educacionais ligadas à exposição e às práticas de arqueologia.

5º — Relações institucionais

Considerada orientação geral da Universidade de São Paulo e do MAE, requalificação das relações:

— Com o Município de Piraju, abrangendo: o estímulo à participação de instituições e órgãos de ensino nas ações e processos educacionais, a inserção da visitação pública às exposições do CENTRO REGIONAL nos projetos de turismo fomentados pelo município.

— Com a administração direta e órgãos e conselhos municipais de meio ambiente e patrimônio cultural dos demais municípios da bacia, especialmente Iepê e Itapeva, outros pólos regionais de arqueologia.

— Com o IPHAN, Condephaat e Ministério Público (Federal e Estadual).

— Com a UNESP – Campus de Presidente Prudente, que mantém núcleo de arqueologia no seu próprio campus, nascido da orientação e cooperação da equipe do PROJETO PARANAPANEMA.

[organização J.L.Morais, 2006]

Equipe permanente do PROJETO PARANAPANEMA atuando em projetos do CENTRO REGIONAL DE ARQUEOLOGIA AMBIENTAL MÁRIO NEME - USP/PIRAJÚ

JOSÉ LUIZ DE MORAIS (coordenador geral), NEIDE BARROCÁ FACCIO (coordenadora regional para o baixo Paranapanema - Iepê), SILVIO ALBERTO CAMARGO ARAÚJO (coordenador regional para o alto Paranapanema - Itapeva), DAISY DE MORAIS (arqueologia da arquitetura; patrimônio arquitetônico e urbanístico), JOÃO CARLOS ALVES (arqueologia-de-campo e curadoria técnica do acervo), SILVIA CRISTINA PIEDADE (arqueologia, curadoria de restos esqueletais); MANOEL MATEUS BUENO GONZALEZ (arqueologia, zooarqueologia), MARISA COUTINHO AFONSO (arqueologia, arqueometria); MARIA CRISTINA OLIVEIRA BRUNO (museologia); SANDRA MEDINA e ADILSON MENDES (apoio administrativo); AMAURI PAGNOSE e MAURO RUBENS DA SILVA (informática); DÁRIA ELÂNIA F. BARRETO e JOSÉ PAULO JACOB (laboratórios de arqueologia); CAMILO DE MELLO VASCONCELOS e JUDITH MADER ELAZARI (educação para o patrimônio); alunos de graduação e de pós-graduação; consultorias especializadas.

Equipe de projeto e obras da Casa da USP em Piraju

Coordenação geral: JOSÉ LUIZ DE MORAIS

Projeto de arquitetura: DAISY DE MORAIS

Colaboração: FILIPE DE MORAIS

Estagiária: CRISTINA RIBEIRO LEMBO

Supervisão de obras: JOÃO CARLOS ALVES

Execução das obras: FUNCIONÁRIOS DA PREFEITURA DE PIRAJU



São Paulo e Piraju

São Paulo é o maior Estado do Brasil e o mais relevante centro cultural. Está associado na percepção pública ao poder econômico contemporâneo, mas também às campanhas para colonizar o interior do Brasil ("Bandeiras") e à declaração de independência. A sua história, porém, recua até tempos pré-históricos, sendo o vale da Parapanema um exemplo disso.

Em São Paulo existe o mais importante museu arqueológico do Brasil, o Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo, que também conduz um projecto em Piraju e nos municípios vizinhos: o Centro Regional de Educação Ambiental. Este centro foi criado em 1972, originalmente dedicado à arqueologia regional (São Paulo e Paraná), mas agindo também na relação entre arqueologia, patrimônio, ambiente e desenvolvimento (um foco essencial desta candidatura).
Piraju é listado como uma das principais atrações turísticas, e a arqueologia tem sido incorporada neste conjunto. As intervenções em Piraju estão fortemente relacionadas com a Geografia e o Meio Ambiente, trazendo assim uma dimensão especial para o projeto global, que é particularmente sensível para a população em geral. Além disso, as noções de patrimônio material e imaterial são inseridas na estratégia deste Museu e do principal parceiro do projecto.
Finalmente, as mais recentes intervenções em Piraju já tiveram um grande foco no turismo, uma outra dimensão importante do projeto como um todo. Um campo específico de atividades do projeto ligando Piraju e Palhoça já foi aprovado pela autoridade nacional de património (IPHAN).

Piauí e São Raimundo Nonato (Serra da Capivara)

O parque arqueológico da Serra da Capivara é Património Mundial, conhecido por um muito particular e bem sucedido plano de gestão, dentro de condições extremamente adversas. O parque protege mais de 1000 sítios arqueológicos e de arte rupestre e alberga uma importante infra-estrutura científica gerida pela FUMDHAM. Esta estrutura tem o envolvimento dos institutos públicos para o património cultural (IPHAN) e ambiente (IBAMA). Tem um grande foco não só na investigação (incluindo, além da arte rupestre, a investigação sobre os primeiros vestígios de ocupação humana no Brasil e na América do Sul), mas também na educação patrimonial e na didáctica.

A região é economicamente uma das mais pobres do Brasil, representando o parque uma parte importante da economia das famílias, e também da sua educação. Novos planos de trabalho estão a ser projectados actualmente. Um projecto mais inovador, chamado PRO-ARTE FUMDHAM, com base na educação artística (que reúne arte rupestre e artes performativas), ganhou vários prémios ("Cidadão 21 Arte" prémio; finalista do prémio "Cultura Viva 2006", projecto " Criança Esperança "da UNESCO, em 2007-2008; ITAÚ-UNICEF - prémio de melhor projecto educacional em 2007). Este projecto inclui três subprojectos: a educação de crianças e adolescentes em expressões artísticas; educação patrimonial e investigação científica e artística; Festival Internacional da Serra da Capivara. Está dirigido para o desenvolvimento das quatro principais competências para a cidadania: ser, viver com, saber e fazer. Artesanato e música estão entre as componentes do projecto, sempre relacionados com o património de arte rupestre.

Nesta actividade, a FUMDHAM tem uma importância relevante na cooperação com os diversos parceiros que, através dela, também estarão relacionados com o presente projecto, a saber: Fundação Oswaldo Cruz do Rio de Janeiro (FIOCRUZ), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), Universidade Federal do Piauí (UFPI), Centro de Tecnologia Mineral (CETEM)- MCT, Observatório Nacional (ON)-MCT.

Convém salientar que o projecto tem uma forte participação europeia, nomeadamente através do Ministério Francês dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação Técnica da Itália. A relevância deste projecto também atraiu fundos de patrocinadores privados importantes, tais como o Iberianamerican Banco de Desenvolvimento (BID), Petrobrás, Embratel, Fundação Ford, Fundação Vale e Bradesco.

O Patrimônio Histórico Cultural em São José e Relações Étnico-Raciais: Desafios e Possibilidades

Tánia Tomázia do Nascimento¹
Joana Célia dos Passos²


Em decorrência das reflexões oriundas com a Semana da Consciência Negra, ocorreu em são José, dia 17 de novembro, a 1ª Oficina em Patrimônio Histórico Cultural e Relações Étnico-Raciais. A mesma contou com a parceria firmada entre a Prefeitura Municipal de São José, o Instituto Terra e Memória Brasil e o Núcleo de Estudos Negros através do Projeto Porto Seguro.
Ministrada pela arqueóloga Tânia Tomázia e a educadora Joana Célia, a oficina foi um espaço de discussão para pesquisadores e funcionários da Prefeitura Municipal de São José, expor e dialogar os desafios e as possibilidades na visibilização de um Patrimônio Histórico Cultural plural, onde os diversos atores sociais, em especial os afrodescendentes, possam ter acesso e ligação com seus bens patrimoniais.
A oficina surgiu por uma demanda da Fundação Municipal de Cultura e Turismo e contou com a participação de profissionais ligados às áreas de educação, museologia, arquivologia, turismo, arqueologia e biblioteconomia.


De acordo com Tânia Tomázia, Patrimônio Histórico Cultural é o conjunto de bens - materiais e imateriais - ou propriedade cultural, composto pela memória e modo de vida de diferentes grupos que formam uma sociedade. De forma que estes profissionais questionaram em que medida o Patrimônio Histórico Cultural, em São José, tem dado espaço para os diferentes grupos que compõem a sociedade josefense.
Reflexão aguçada com o descortinamento das questões raciais, feitas por Joana Célia, que discutiu analiticamente o conceito de raça, suas implicações de um ponto de vista biológico e o seu real significado dentro do contexto histórico, social e político brasileiro, marcado pela desigualdade. Questões como racismo científico, política de branqueamento e o mito da democracia racial, apregoado por Gilberto Freyre, e ainda reinante, foram avaliados pelo grupo.
Pautada pela Pedagogia Multirracial e Popular, a oficina trabalhou conceitualmente o tema proposto, partindo da realidade de cada participante que expuseram, refletiram e construíram questionamentos, sempre buscando soluções a partir de sua própria realidade.

Os resultados das reflexões apontaram para uma postura ainda tímida para as discussões sobre as relações étnico-raciais e patrimoniais em São José, mas foi de comum acordo a necessidade de mudanças, pelo que o grupo construiu encaminhamentos e se dispôs a executá-los, de forma que atividades coletivas estão em andamento.


¹ Doutoranda em Quaternário, Materiais e Culturas, pela Universidade Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), Portugal
² Doutora em Educação, pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Brasil

  © Free Blogger Templates Autumn Leaves by Ourblogtemplates.com 2008

Back to TOP